quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Transparência nos demonstrativos contábeis



O caminho das empresas brasileiras rumo à convergência contábil deu um importante passo em dezembro de 2007. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a nova Lei Contábil, aprovada pelo Senado após sete anos de tramitação. Ela determina, entre outras medidas, a publicação dos demonstrativos contábeis individuais de acordo com a International Financial Reporting Standards (IFRS), padrão mundialmente utilizado. As novas exigências promovem a harmonização da contabilidade brasileira e garantem balanços societários mais transparentes. Também fornecem ao mercado informações detalhadas sobre as empresas, facilitando os investimentos estrangeiros. Os dados publicados no Brasil poderão ser entendidos em qualquer país. A medida valerá a partir de 2010, quando todas as companhias de capital aberto e as instituições financeiras deverão apresentar suas demonstrações consolidadas, atendendo às normas do IFRS, comparativamente ao ano anterior, 2009. Atualmente, dezenas de países obrigam suas empresas a apresentar demonstrações consolidadas com base no International Accounting Standard Board (IASB), um conselho europeu de padrão contábil. Com as crises corporativas, houve a aceleração da convergência para o padrão internacional. As mudanças completam um conjunto de leis elaborado para fortalecer a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Segundo o sócio da PricewaterhouseCoopers, Fábio Cajazeira, o órgão se torna responsável por ditar as normas contábeis a serem observadas pelas companhias abertas. Para isso, utiliza um organismo multidisciplinar, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Formado na sua maioria por contadores, profissionais representantes de empresas preparadoras de demonstrações financeiras, professores, auditores e pesquisadores, o CPC ganha autonomia legal para promover a harmonização dos padrões. O órgão independente foi criado em 2005 para liderar o processo de convergência brasileiro ao IFRS, já adotado por 107 países.Deverão ser publicados nos novos moldes os balanços de todas as companhias abertas e de capital fechado com ativos acima de R$ 240 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 300 milhões. A autarquia já exigia que as empresas com operações na Bovespa adotassem as medidas, como é o caso das Lojas Renner, que há quase três anos deu início aos processos de adequação. Analistas questionam capacidade de adequação a curto prazoO sócio da PricewaterhouseCoopers, Fábio Cajazeira, acredita que a adaptação das companhias aos novos modelos será feita conforme a velocidade de emissão de normas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). De acordo com ele, um ponto importante que impulsionará o movimento das empresas para a adoção das normas internacionais (no primeiro momento as empresas de capital aberto e, posteriormente, de capital fechado), é a separação que foi promovida entre a contabilidade fiscal ou tributária e a contabilidade chamada de empresarial. Um dos entraves que historicamente impedia as empresas brasileiras de adaptarem seus modelos de informações ou suas demonstrações financeiras à norma internacional era exatamente o impacto que traria para sua carga fiscal. Ela poderia pagar mais impostos do que vinha fazendo normalmente, o que não incentivava a adoção dos padrões internacionais. "Ao separar as duas contabilidades, que têm objetivos distintos, devemos ter um impulso na migração para o modelo de demonstrações financeiras baseadas em princípios internacionais", disse Cajazeira.Segundo ele, o governo passa a ter a garantia de que não haverá redução no recolhimento dos impostos enquanto as empresas têm garantia de que poderão usar práticas contábeis mais modernas, transparentes e de melhor qualidade sem que isso implique um gasto maior com tributos. De acordo com o presidente do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) da 6ª Regional, Antônio Carlos Palácios, o prazo para as empresas se adequarem aos padrões internacionais de contabilidade é exíguo para a realidade brasileira em alguns aspectos. Principalmente pela necessidade de transformação das formas de contabilização e dos procedimentos internos. "O balanço de uma sociedade anônima é sempre comparativo. Com a exigência da publicação dos dados em 2010, já no próximo ano a empresa deverá organizar as informações de acordo com os novos padrões", afirmou Palácios. Para ele, entretanto, é inviável o funcionamento das companhias sem o acompanhamento imediato das normas internacionais. Até o momento, o CPC emitiu apenas um pronunciamento buscando a convergência. Conforme o presidente do Ibracon, outras determinações estão em fase de audiência pública, que dura em média três meses. "É difícil imaginar que no início do próximo ano possamos exigir das empresas os seus balanços de acordo com as normas internacionais, mesmo considerando apenas as grandes. Alguns pontos não dependerão apenas delas, mas sim de órgãos reguladores que são pouco ágeis", disse Palácios.Outra diferença entre os padrões nacionais e internacionais é a valorização dos ativos. No Brasil os bens são incluídos com o valor de aquisição. Já no IFRS, o registro ocorre pela efetiva cotação de mercado na data em que estiver sendo fechado o balanço. Cajazeira ressalta, entretanto, que os ativos e passivos não passarão imediatamente a ter valor de mercado na legislação brasileira. Lojas Renner iniciou processo de adaptação em 2005Uma das empresas que já deu início à adaptação dos padrões internacionais foi as Lojas Renner. O processo começou em 2005, quando a rede passou a ser listada no novo mercado da Bovespa, onde uma das exigêcias é que as empresas apresentem as demonstrações contábeis pelos padrões internacionais. Segundo o gerente-geral de controladoria, Gildo Melo da Silva, o grupo apresentará neste ano as informações referentes ao exercício de 2007 de acordo com as regras internacionais. Para adotar os padrões foi treinado um time de profissionais nas práticas internacionais de contabilidade. "Buscamos conhecimento, uma vez que já operávamos com as práticas brasileiras", explica Silva. O passo seguinte foi a análise dos diferentes conceitos entre as práticas nacionais e estrangeiras. Posteriormente, foi feito o levantamento das empresas das diferenças existentes e a preparação aos procedimentos contábeis. Segundo Silva, para atender às exigências houve um aumento no quadro de pessoal do setor. A rotina da contabilidade passou pela estruturação da equipe, de forma que os integrantes pudessem se adequar aos novos procedimentos e gerar as informações nos dois modelos. "Fazemos as demonstrações nos padrões nacionais e internacionais, pois continua sendo exigido o modelo societário no Brasil", diz.Entre as vantagens das mudanças Silva cita o maior entendimento do desemplenho financeiro e situação patrimonial pelos investidores internacionais. "As medidas tornam a empresa transparente no mundo. O empresário de qualquer país que ler as demonstrações contábeis das Lojas Renner entenderá o desempenho do grupo".A transparência e qualidade de dados gerados também colaboram com os bons níveis de governança corporativa. "Os mercados são globais. A adoção de práticas internacionais melhora a qualidade de informações para os investidores", afirma Silva. Profissionais têm oportunidade de ingressar em novo mercadoA adoção das normas internacionais de contabilidade requer atenção e preparação dos profissionais. Para o presidente do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) da 6ª Regional, Antônio Carlos Palácios, até o momento nenhuma regra foi traduzida para o português. Por isso, o Ibracon está traduzindo nove normas, com previsão de término em março. Na opinião de Palácios, o contador não deve apenas ter noções de contabilidade internacional, mas deve também dominar outros idiomas. "É um novo mercado, cabe ao profissional se adequar. Quem deseja trabalhar em grandes empresas tem a oportunidade de garantir seu ingresso no novo nicho", afirma. Com a nova lei, surgem duas frentes. De um lado, as empresas devem se estruturar para atender à convergência. Do outro, os profissionais necessitam se preparar para atender à demanda. "Já as entidades vão se preparar para acompanhar e apoiar os contadores", garante Palácios. Conforme o sócio do setor de Auditoria da Deloitte, Edimar Facco, a mudança exige uma adaptação estrutural para informar dados confiáveis no processo de divulgação das demonstrações financeiras. Isso envolve a qualificação de profissionais e uma transformação cultural que incide na alteração do sistema. "A introdução do IFRS acarreta mudanças nos indicadores de performance, nos lucros obtidos, na remuneração de executivos, nos sistemas contábeis e de reporte, no treinamento de profissionais e no contrato de fornecedores", diz Facco.O sócio da PricewaterhouseCoopers, Fábio Cajazeira, diz que quanto mais complexa a organização e mais descentralizada, mais complexo será o processo de conversão para IFRS, o que tende a ter efeitos importantes sobre os números finais da empresa. "É uma tarefa que exige a atenção da alta administração e o treinamento intensivo. É preciso capacitar também as áreas operacionais, afirma Cajazeira. O contador captura as informações geradas pela área de operação. Se estes não dominarem a nova linguagem, a informação que será gerada para a contabilidade poderá ter deficiência. "É um trabalho que envolve praticamente todos os setores", finaliza Cajazeira.
JC Contabilidade - Por Luciane Medeiros -09/01/2008.

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